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Minas Colonial e suas conexões

         



            Nos dias atuais é muito fácil termos produtos fabricados em outros países ou que a matéria-prima é produzida em um país e o objeto é feito em outro e vendido em outro, por exemplo, e as lojas virtuais facilitam muito esse trânsito, assim como os novos e rápidos meios de locomoção. Quando pensamos no período colonial, porém, na maioria das vezes somos tentados a pensar que esse comércio não existia, primeiro porque o Brasil não podia comercializar com outros países além de Portugal, e segundo porque não existiam ainda aviões e essa troca era feita por meio de navios que eram menos velozes. Porém não era bem assim.

            Vários historiadores utilizam como fontes os inventários post-mortem (feitos após a morte que tinha o intuito de repartir os bens do falecido) e os testamentos para suas pesquisas do período colonial mineiro, e neles é possível perceber muitos artefatos religiosos e/ou domésticos, roupas e tecidos vindos de outros espaços de ocupação portuguesa, como a China, o Japão, Índia, e África e sim, no período colonial! Algumas peças inclusive são de matérias-primas que nem são nativas no Brasil, como o marfim, muito presente na África. Um exemplo é a imagem 1 que se trata de uma peça religiosa de marfim pertencente a um morador de São João del-Rei, e mais, ela foi feita no Ceilão (atual Sri Lanka, situado na Ásia ao sul da Índia), que também era um domínio português, assim como o Brasil.

            A partir disso, é interessante pensarmos como era complexa a circulação de mercadorias nos espaços do Império Português, tanto no Ocidente, quanto no Ocidente, e como Minas Gerais está inserida nesse contexto. É necessário pontuar que havia também a circulação de colonos nessas terras que eram responsáveis por esse trânsito de objetos, plantas e até mesmo de alimentos. A manga, a canela e a pimenta são produtos Orientais, não brasileiros, e mesmo assim nós os incluímos na nossa culinária. Quem não gosta de um arroz doce com canela?

            Por fim, um ponto necessário para a discussão é: quem eram as pessoas que faziam uso desses objetos e mercadorias? Sim, eram as pessoas mais ricas, porque dependendo do material e do que era a peça, porque as imagens religiosas de marfim eram mais caras que os demais objetos, poderia valer o equivalente a uma cabeça de gado. Mas isso não quer dizer que os alforriados não poderiam ter dinheiro o suficiente para possuírem uma produto do Oriente por exemplo. Algumas ex-escravas residentes em Minas Gerais possuíam em seus inventários muitos objetos valiosos, inclusive escravos. O que o historiador Eduardo França Paiva considera é que essas mercadorias sofreram alterações em seus significados e usuários ao serem transportadas de um continente ao outro. O mundo colonial não foi tão imóvel quanto pensamos.

 Texto por: Rafaela Guimarães 















REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

PAIVA, Eduardo França. Marfins e outros suportes – transposições, traduções, associações e resignificados de objetos nas Minas Gerais (século XVIII). In: O comércio de Marfim no Mundo Atlântico: circulação e produção (séculos XV a XIX). Dados eletrônicos – Belo Horizonte: Clio Gestão Cultural e Editora, 2018, p.15-40.

WORKSHOP: CULTURA MATERIAL NOS ARQUIVOS E MUSEUS DO BRASIL E GOA. Universidade de Coimbra, 2021.

 

REFERÊNCIA DAS IMAGENS:

Imagem I: disponível de forma remota no site da Coleção Osvaldo Gil Matias. In.: http://osvaldomatiasivory.com/?page_id=1307.

Demais imagens: disponíveis de forma remota no acervo online do Museu da Inconfidência. In.: https://museudainconfidencia.museus.gov.br/acervo-on-line

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