Faça uma breve apresentação sobre você.
Meu nome é Duda Xavier, sou estudante do 6• P de
jornalismo na UEMG, fotógrafa, artista visual, co fundadora do coletivo de
Movimento Negro Kianga
Me fale um pouco da sua vivência como mulher negra.
Venho de uma família inter-racial, que como muitas
no Brasil não se racializa. Nesse sentido me descobrir politicamente uma mulher
negra veio acompanhado da minha inserção na militância. Sempre me vi a margem
dos espaços que ocupava e entender nos últimos 4 anos, esses lugares como
lugares em que o racismo me colocou mudou muito a minha vida. Não que eu tenha
parado de sofrer ataques, mas compreender ancestralmente a minha origem faz com
que eu não me sinta tão só. Me entender hj enquanto negra é retomar dos braços
coloniais a minha autoestima, o meu poder e minha prosperidade
Quando e porque você viu a necessidade do movimento
Kianga dentro da Universidade? E qual a motivação do movimento Kianga?
Entendendo a Universidade como a cúpula de formação
e produção de conhecimento da sociedade, não é difícil entender que se a
sociedade é racista esse espaço mais que fomenta, valida esse racismo. Somos
nós pretos, os que ocupam o ranking da evasão nesses espaços. Realmente não é
um lugar pensado para nós. Nos mata intelectualmente, fisicamente e
afetivamente. Unir todos os nossos isolados é estratégia de luta e também de
sobrevivência dos nossos corpos e do pensamento africano
E porque o nome do movimento é Kianga?
Na cultura africana existe um reconhecimento em
relação ao poder que um nome tem. Nesse sentido fizemos uma votação em que foi
escolhido um nome na língua yoruba. Kianga é raio de sol e é sobre a capacidade
de atravessar mesmo os espaços menores e ainda sim trazer luz
Qual foi a experiência na criação do movimento até
sua execução de fato?
O coletivo nasceu da organização proposta por um
núcleo já existente, o Neirer (núcleo de estudos das relações étnico raciais).
Vimos a necessidade de ter uma frente mais embativa de combate ao racismo.
Inicialmente começamos com os integrantes do núcleo e depois agregamos outras
pessoas
Como você classifica a aceitação da Primeira Semana
de Integração na UEMG Divinópolis que foi realizada em junho de 2019 pelo
movimento Kianga?
Acredito que a semana foi muito importante para o
nosso coletivo e também pra universidade. Ver pessoas pretas se afirmando na
posição de trocar saberes em um espaço em que isso nos é negado é muito
potente. Além do fato de ter sido uma oportunidade enorme pra nós mostrarmos
presentes nesse espaço
Você se sente representada pelas mídias?
Falo isso enquanto mulher negra e enquanto
comunicadora: se hoje o pensamento hegemônico me coloca no lugar de violência e
marginalidade é pq a mídia está inserida no acordo colonial. Tenho muita
esperança na comunicação alternativa e autônoma. E acredito que com fundamentos
antirracistas a situação pode melhorar muito.
E na política você se sente representada?
Hoje em dia temos referências negras muito
potentes. Áurea Carolina, Andrea de Jesus, Erica Malunguinho, Érika Hilton. E
fico muito feliz em ver pessoas negras com fundamento na política. Mas ainda
sim vivemos no país que assassinou Marielle, tem muito pra se construir
Como você vê a representatividade negra na
sociedade atual?
Enxergo com uma potência enorme discussões que
antes eram focadas em grupos muito pequenos chegando a diversos lugares. Mas
prezo muito pelo cuidado com aquilo que a gente elege como “representante”. Sou
de religião de matriz africana e os nossos mestres se tornam mestres pelo seu
povo e pela caminhada. Não por concessões brancas
Como você enxerga o negro na sociedade na atual
conjuntura do Brasil, levando em consideração a política e a pandemia?
Não é atoa que a primeira morte pela Covid no
Brasil tenha sido de uma mãe, negra e trabalhadora do lar. E a mais de 500 anos
os nossos ocupam lugares de morte como os que estão colocados pelo vírus,
racismo e violência do Estado
Como você enxerga a necessidade do ensino
afro-brasileiro na educação básica? E no ensino superior?
Acredito que a base pra construirmos outras
perspectivas para negras e negros é a retomada da nossa história. Portanto
também me importa muito quais olhos contarão as nossas, como contarão e se
contarão
O movimento trabalha questões de
interseccionalidade de gênero e sexualidade. Qual a importância dessa relação
para o movimento?
Acredito que essa questão é fundamental para
entendermos que mesmo negros não somos uma massa homogênea. Que existem
violências que permeiam a nossa comunidade e que os nossos problemas precisam
ser conversados em coletivo
Qual o papel da branquitude na luta antirracista?
Acho que primeiro se excluir da condição de homem
ou mulher universal. Em que sempre estará em posição de protagonismo. Fazer do
mesmo esforço para pesquisar, escutar que existe com outras culturas, também
com a cultura africana e suas diásporas.
Em pesquisa pelo instagram do movimento encontrei o
termo afroafetividade. Poderia discorrer um pouco sobre o tema?
Quando colocamos apenas a palavra afeto se imagina
não apenas uma relação entre pessoas brancas, mas fundamentalmente
eurocentrada. Somos um grupo que negados de nossa humanidade a nós também foi
negado o afeto. Afroafetividade é retomar corpos pretos como dignos de serem
amados, valorizados, reconhecidos em todas as suas esferas
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